sábado, 20 de julho de 2013

CRONOGRAFIA




Tenho uma cave de caixotes cerrados

Devidamente empilhados        

Ordenados na cronografia de um rosto



Tenho uma cave de faces vendadas 

Vedadas figuras

Solenes na aparência de um mundo



Tenho uma cave de incómodos silêncios

Indevidamente calados

Amordaçados silenciosamente

Ocultados no culto de um nome



Tenho uma cave de proscritos propósitos

Esquecimentos propositados

Inoportunos incêndios

Imolados em fogo-algum



Tenho do tempo a insanidade

E na cave     para nós      o reservado espaço





.

18 comentários:

  1. Qual caixa de Pandora, onde o poeta vai guardando os seus medos, ritos e mitos de uma vida.

    Gostei

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  2. Recortes de um tempo proscrito
    silêncios de imolada insanidade...

    Obrigada, Filipe, por partilhares com o leitor
    este poema prodigioso.

    Bom fim de semana

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  3. Simplesmente magistral este teu poema,não somente

    no conteúdo,mas a forma dita poeticamente...

    O espaço da memória recriado e organizado interiormente como caixas do

    tempo-vida inscrito e proscritos em silêncios de mudos gritos questionados

    do cenário mundo...

    Mas existe no tempo, o milagre do esquecimento

    para tudo de menor valor...

    Para mim, apreciadora da poesia essencial, ler-te

    torna-se um momento único,inscrito em minha alma...

    Bjo.

    Ps: Senti a musicalidade do poema e pensei na beleza deste declamado...

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  4. Todos nós temos uma cave.
    E o seu “recheio” diz muito de nós…

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  5. Uma cave
    com caixotes trancados,
    lacrados pela mente:
    aquilo que podia e não foi,
    aquilo que foi e não era para ser,
    aquilo que era para ser e não deu tempo
    Tudo numa cave
    seguro
    guardado
    lacrado
    conservado
    esquecido, vencido, submergido
    num egoísmo interno
    das coisas que não serão
    e que nunca se libertarão
    mas
    há uma música na cave
    onde só dois poderão ouvir
    no espaço reservado
    na cave com caixotes lacrados
    pela vida inteira
    dum coração....

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  6. Memórias, esquecimentos, rostos, aparências, propósitos,sonhos, silêncio... Quantas caves não existem na geografia de uma única pessoa? E quando o poeta entreabre uma de suas caves, algo desconhecido se move no fundo de nós, e nosso relevo se modifica. Teus versos tiveram esse efeito em mim.
    Abraço!

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  7. Tenho do tempo a insanidade
    E na cave
    para nós
    o reservado espaço

    A sua poesia me encanta, Filipe.

    Beijo.

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  8. Na memória cada traço
    Cada lembrança
    Cronologicamente guardada

    (empilhamos em nós sentimentos e momentos)

    Sílaba incógnita
    Som calado em escondido sonho
    Exilada vontade
    Nascida em insanidade

    Mas um espaço que aguarda ainda neste tempo.

    Uma poesia em fracções de um passado, mas também de um futuro.

    Pergunto-me, se sabes como a tua poesia tem o poder nos abrir “portais”

    Adorei, este poema.
    (não só este:)

    Beijinho

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  9. Caves me remetem ao inconsciente, todos temos caves, precisamos tê-las, mas as vezes, não conseguimos nos comunicar, e precisamos destes espaços, para poder habitar, mas precisarmos poder circular entre elas também, tão complexo poder comunicar isso, acredito que você conseguiu alcançar...

    Um abraço, poeta

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  10. Querido Poeta


    As recordações são a bagagem que teremos que carregar pela vida fora...são a pele que vestimos e a essência da nossa alma.
    Como sempre fico sem palavras perante o teu talento de descrever sentimentos.

    Um beijinho
    Sonhadora

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  11. Filipe, meu caro poeta Filipe, necessitei de muito silêncio para estar aqui, quando eu digo estar aqui, quero dizer, para registrar algo minimamente inteligível no seu blogue - durante todo o tempo não saí do Porta-Sonhos, mas mantive-me em silêncio. Porque eu não queria macular com minha verve prolixa, o sagrado do poema, porque eu não queria soltar as asas dos sonhos que a sua poesia inventou em mim, porque eu não queria desocultar todo o (meu) sentimento que ele revolveu, porque eu não queria ter que escutar o que propositadamente deixei cair no esquecimento. Mas não adiantou nada, o tempo todo o poema me consumia, me provocava, me dizia, exigia uma postura, uma assunção, e não deu mais para fugir dele, disso...
    Estranhamente o texto se transmutava a cada leitura, pois em seguida necessitava de uma releitura, e nesse desespero poético debrucei-me incessantemente na métrica, na estética, na arquitetura do poema, para afastar-me da insistente voz do meu eu-lírico, que se viu frente a frente com o meu eu-real. De nada adiantou, e fiquei vagando entre "os caixotes empilhados na cave", tentando apagar o incêndio devastador que mais uma vez a sua poesia me causou.
    Ler-te é sempre um exercício de dilatação, transmutação e elevação da alma, entretanto, ler-te neste poema, fez-me entender da minha inexorável condição de humana, de todos os paradoxos que encerro e do quanto cada poesia tua inaugura novas sensações em mim... Obrigada por ter reacendido tantas memórias.

    P.S.
    Não consegui mais uma vez, ser sucinta (sua poética não deixa), perdão!

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  12. Fico feliz pelo poema que me diz
    que nessa cave de arrumações
    existe espaço reservado
    para dois. :-)

    (eu tenho sótãos, arrecadações e neles embalados tantas lembranças, sorrisos, emoções...

    (ando um bocadinho parva e as palavras saem em rima e depois não me apetece emendar, lol mas são sentidas estas palavras escritas :-)
    Bjs

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  13. Restou um espaço reservado...Muito bonito, Filipe. Beijo!

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  14. Filipe,

    Vim para agradecer seu comentário no meu outro espaço Diálogos coma Psicologia e a Psicanálise. Não sei se fez o link que sou a responsavel pelo espaço do PALAVRA DE MULHER e deixei um comentario anteriormente aqui com meu nome completo.

    Abs, poeta

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  15. Uma cave onde se guarda emoção transmitida por enorme talento.
    Um melodioso poema com uma energia vibrante.

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  16. Cheguei aqui por acaso...e ainda me sinto em estado de contemplação.
    Que nessa cave guarde sempre um espaço, para a insanidade dos seus sonhos...

    Abraço!

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  17. Imagino... o rasgo, a violência e a coragem, de uma descida assim...à cave.
    Reconheço... A força tremenda, a profundidade e densidade, do espólio que nos é deixado...!

    Abraço

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  18. Um poema com uma estrutura em crescendo, começando pelo objeto (caixotes), passando à pessoa, referindo o exterior (faces) como ponte de passagem (ou reflexo do espelho) para um interior pensante (incómodos silêncios, proscritos propósitos)…Através desta estrutura cuidada mas criteriosa com vista à mensagem, o sujeito poético vai libertando os seus incómodos e a sua incomodidade... Apesar do tempo, a memória não deixa esquecer o que (nos) marcou!
    Mais uma vez te deixo a minha admiração: um poema soberbo, poderoso…
    Bjs, amigo Filipe :)

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