quarta-feira, 16 de outubro de 2013

A Insondável Distância de Um Abismo






Da sombra sou a profundidade
A raiz negra da escuridão alastrando invisibilidade

Do tempo sou o arco que se dobra
O difuso contorno de um vestígio longínquo



É insondável a distância de um abismo
O alongamento do tempo tangido num rasto invisível
                                                               progressivamente distante



Não são os séculos que nos formam
               numa narrativa de irremediável ausência

É a divergente equação de uma incerteza
                             caminhando contra o esquecimento

«Não olhes para trás   
Nunca olhes para trás
A memória é um divino inferno de horrores»



É intangível a superfície de um reflexo
             que na sombra se oculta por completo
iniciando incomum movimento
distanciando o tempo



É incalculável a extensão de um precipício
              que se mede numa escala de fissuras
na dimensão dizível de uma ruína  
                                                     brecha a brecha   
                                           na pedra rasgada



É inegável a fragmentação do solo
A segmentação irrefutável das épocas
                                  A fissura que rasga o corpo



.


quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Um Outonal Tremor de Abandono








Havia do tempo uma idade      uma secreta urgência    uma ausência por habitar           
Havia um passo estruturado percorrendo                       
Uma essência estrutural
Havia uma ideia                             
Uma utopia inebriada num lirismo de olhar


Depois vieram as chamas     as farsas   os dramas   
A lírica tragédia de uma voz insana
Vieram os fogos    os incêndios       a combustão
Invariadamente vieram vezes vazias          vazias várias vezes vieram


Onde havia um luminar andamento há agora um tropeçar
Medos       arvoredos      relevos          
Densos      penosos        profundos
Uma colisão de destroços que fissura as ruínas de um mundo devassado
Fragmentos sombrios              absurdos vítreos num quebrar de espelhos


Há uma descrença lenta que dentro adentra                   
Um outonal tremor de abandono                   
Um instável equilíbrio no desequilibro de um grito


Digo recolhimento num silenciar de tumultos         e ascendo à lírica lucidez da loucura
Digo caminho num trilhar de palavras     e descendo à fulgente insânia que me sustenta
Ao limite do poema


Se é sombra o que escrevo     se negro é o tom do verso 
Na sombra me inscrevo          da escuridão me confesso             se assim enegreci



Às vezes recuso            às vezes refuto                às vezes contesto  
A labareda que cerca     a insone lamúria              o dolente infortúnio
A silenciosa indolência e a silente desistência

Este indigente perecimento    ausente   informulado   inabitado


Recuso este impercetível alinhamento de proposições
Este esboço de linguagem onde me resto palavra

Inflexo poema que não endireita
Palavra-fronteira    talvez território
Se de mim já não depende
Se de mim se escapa


Recuso principalmente este canto confuso e esta verve perturbada
Esta oração na pena fecundada
Este letárgico dissenso em melancólica dissensão
Este tempo dizendo
nada


.      


sábado, 20 de julho de 2013

CRONOGRAFIA




Tenho uma cave de caixotes cerrados

Devidamente empilhados        

Ordenados na cronografia de um rosto



Tenho uma cave de faces vendadas 

Vedadas figuras

Solenes na aparência de um mundo



Tenho uma cave de incómodos silêncios

Indevidamente calados

Amordaçados silenciosamente

Ocultados no culto de um nome



Tenho uma cave de proscritos propósitos

Esquecimentos propositados

Inoportunos incêndios

Imolados em fogo-algum



Tenho do tempo a insanidade

E na cave     para nós      o reservado espaço





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sábado, 18 de maio de 2013

CLAUSURAS








                                                                                «O verso constrói clausuras
                                                                                Espaços retidos num tempo
                                                                                Claustros de errático temor
                                                                                Alongando infundadas esperas»



O mundo colapsa sepultando os versos
Fissurando a voz em ruínas


O desespero não se diz

não se escreve

não se canta


Espreita
No vermelhar raiado que avisto neste espelho



O corpo colapsa aluindo nas veias
O sopro em ruínas


A agonia não se escuta

                não se ouve

não se entende


É voz detida no tempo
Como a quimera trespassada que distingo neste nevoeiro


Anoitecem tardes frias
Anoitecem velhos ritos
Anoitecem irrefreáveis fervores


Somos do sonho
A tentativa
A hipotética via
O desentendimento


Dissoluções esféricas na métrica de um verso
                                                                        Infâmias


Possa o tempo afastar as palavras        contaminadas
As destrua               reconstrua            e as devolva intactas
Ao poema que te precedeu




quinta-feira, 7 de março de 2013

Abissais Representações da Renúncia








perto do Precipício
a berma insinua-se como margem
    subtilmente tentando
                                       tentado passo

Suicidários abismos             
                de horas irrelevantes
confrontando 
                              o erro errante

Chagas casuais
Permanecendo    
Tempo

Perpetuidades corrompendo      
Infinitesimais



próximo do Abismo
o corpo vacila 
    subtilmente preparando
                                            vazo espaço

Evocando sob as orlas
imorais rezas
              impúdicas súplicas
                         circunstantes transparências


Abissais representações da renúncia

Imbuindo incêndios
em incessante deflagração

Impondo refúgios
de pronominal nomeação



face à Falésia
a queda anuncia-se
    subtilmente predizendo
                                               Fim