sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

CONTRA-CORRENTE (Uma Neurótica e Autocrítica Proposta Linguística para uma Neo Linguagem)





(Leitura de Ana Celeste Ferreira
a quem muito agradeço a honra e o privilégio)





Poderia retomar do verso singular a sua singular simplicidade
Abdicar da intangível abstracção que não se alcança
Renunciar à morfológica anatomia de uma linguagem  
Cessar este recurvado curso contra a corrente


Poderia desconstruir-me numa estrófica desconstrução
Sucumbir à singularidade linguística de um neo-poema
Fraccionar o verso-
- uno numa dualidade de linhas fragmentadas
Render-me ao objecto concrecto da antístrofe  
(Objectivamente ceder)


Poderia resgatar       talvez até instintivamente     a instintiva percepção de uma rima-refrão
Recuperar    quem sabe      a sonoridade interior de uma canção entristecida


E, talvez, a vírgula devolver ao devoluto lugar,
(ponto final não)
Pontuar assim os sinais, acentuando-me,  
Desobstruir-me ocupando o espaço,
Assinalar as dúbias reticências de uma grafia abatida


A propósito de uma proposição, (...),
Previamente prescindir da prévia representação
Desnudar todas as hipérboles, descerrar todas as metáforas,
Prosar-me, sem ênfase, num poema pós contemporâneo


E em concrecto escrever-me num concreto neologismo lexical,
Erguer-me na erudita vanguarda de uma imagética retirada,
Circunscrever o exacerbado excesso à exacta dimensão da palavra


Talvez assim, pudesse ser finalmente poeta
E, então, num translucente verso-dizer-te
O que poderíamos Ser


sábado, 4 de janeiro de 2014

A Nocturna Vigília do Pranto Oculto das Sombras





As sombras invadem um mundo como hordas semblantes   
Povoam abandonados espaços    
Apossam-se na escuridão   da escuridão da luz errante

Em taciturno caos avultam-se decrépitas figuras
Silhuetas de destituídos contornos
Esbatidas no retraçar de um símbolo   inscrito em infinitos círculos

Cingidas   as sombras agigantam-se    inclinam-se sobre o corpo    abatem-se sobre a face

É íngreme o caminho conducente à ascensão
A nocturna vigília do pranto oculto das sombras


As sombras apoderam-se da razão como hordas errantes
Avolumam-se no obscurecimento da memória 
Apartam da luz   a luz semblante da escuridão

Iluminadas    as sombras são labaredas insanas  
Silhuetas esparsas de um fogo
Incêndios ocultos no corpo  

Inquieta é a noite que se estende num sibilar de vento infame
Débil é o desígnio ocluso que se sente silêncio impronunciado

Silenciadas   as sombras arrastam-se    contraem o rosto    desabam sobre o corpo

Árdua é a crisálida do monocroma de uma lágrima
Na nocturna vigília do pranto oculto das sombras


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