sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Ponto Vírgula Reticência








I.



Há no ponto final um traço conclusivo

Um peremptório termo

Um concludente absolutismo                 que me atormenta.



Como pausa maior da voz

O ponto é um tempo sustado num só sinal



Um lugar abrupto

Um espaço curto

Um sopro subordinado

O tom que separa o tom



Há no ponto final uma ausência

Um idioma ausente

Um silêncio cansado



É o ponto que encerra a fala ou a fala encerra o ponto?



II.



Há na vírgula um intervalo inconclusivo

Uma inflexão desconhecida

Uma inconcludente relatividade               que me inquieta.



Como pausa menor da voz

A vírgula é um tempo dobrado num exíguo sinal



Um conciso sulco

Um respirar avulso

O espaço entre espaço maior



Há na vírgula uma conjugação adversa

Uma sequela perversa

Um silêncio semi-breve



É a vírgula que suspende a fala ou a fala suspende a vírgula?




III.


Há na reticência uma fala muda

Uma entoação desnuda

Uma ênfase insubordinada

Uma sensação de impunidade               que me seduz



Como voz sem voz

A reticência é um indício, um vestígio, um sinal



Um tempo imprevisto

Um espaço oculto

Um lugar de culto

O rasto a desvendar



Há na reticência uma voz suspensa

Uma insinuante subjectividade

Um canto por cantar



É da reticência que nasce a fala ou da fala nasce a reticência?




.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Pas-de-deux








I. Entré




«L  o  n  g  o   é o tempo
Estreito é o estrado.
Como um sustado compasso
Assim é o percurso num só passo»



II. Adage



Dos espaços sobra o espaço
O tempo sem lugar
O sonho fátuo
O corpo em fuga

      Dos tempos resta o tempo
O espaço sem lugares
O sonho fugidio
O corpo fugaz



III. Variations



Face a face
Descerro o rosto.                                                      
Nuas sombras sobrepostas                                                               
Testemunho sem memória                                                             

Como um tempo quebrado
Em lento deslizamento.
Passo    após     passo
Desfiz todo o movimento

Assim quebrada me quedo
Entre delidas linhas.
Como um corpo sem contorno
Entre névoas declinado


Rosto a rosto
Desvendo a face.
O relevo retirado
A oclusa obscuridade

Queda após queda
Em movimento me desfiz.
Como um tempo dobrado
No vértice das horas

Assim caído me quedo
Num inerte deslocamento.
Qual gesto incompleto
Inclinado sobre o verso




IV. Finale



«Agitadas águas
Submersas mágoas.
Como um corpo erguido
Recente se anuncia o tempo.

Comme un temps lié
Comme un Pas-de-deux»












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